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Neoplasias e o Cancro / Câncer (Parte 2)


Efeitos dos tumores


Destruição dos tecidos: o crescimento e invasão tumoral provoca a destruição dos tecidos normais, com efeitos na sua função –Ex.: um tumor da hipófise ao crescer ocupa e destroi a glândula normal, levando ao hipopituatarismo; em superfícies mucosas ou cutâneas a destruição tecidular causa úlceras como hemorragia e infecção;

Pressão local sobre os vasos sanguíneos –reduz a irrigaçãodos órgãos adjacentes a jusante;

Destruição do parênquima com libertação de enzimas que destroem os tecidos (MEC e MB);

Ligação de estruturas com restrição dos movimentos (respiratórios ou peristálticos);

Obstrução e compressão de passagens importantes (Ex.: tumor dos brônquiosbloqueia o fluxo aério; carcinoma do esófagoou da faringe interferem com a deglutição; tumores pélvicos avançados obstróiem os ureteres levam à insuficiência renal);

Associados à infecção: imunossupressãogeraleralizada do sistema imunitário e da medula óssea, reduzindo a produção de neutrófilos e monócitos; danos na função de barreira, faforecendo a penetração de microrganismos infecciosos.



Anemia
- Causa directa: hemorragia associada à disrupção de vasos sanguíneos em superfícies corporais como nos tumores digestivos ou genitourinários; hemóliseautoimune por indução tumoral (leucemia, linfomas)
- Causas indirectas: mielossupressão, com baixa produção de glóbulos vermelhos e plaquetas, causada, quer pela produção de substâncias supressoras pela medula óssea, por radioterapia, quimioterapia ou baixa produção pelo fígado, quer pela invasão medular por células tumorais; deficiente produção hepática de factores de coagulação

Dor tumoral
- Invasão de ossos (fracturas) e nervos;
- Obstrução com distensão de órgãos ocos;
- Invasão da medula espinal com compressão –glioma e meningioma.

Caquexia:impacto cumulativo dos vários efeitos do tumor:
- Dor, ansiedade, depressão, fraqueza e debilidade profunda
- Febre, palidez (infecção e anemia)
- Anorexia, resultante de alterações do paladar e do centro do apetite. A ingestão calórica está assim reduzida, numa situação em que o metabolismo basal e consumo de energia estão aumentados e a absorção é deficiente, levando à consequente perda de peso e adinamia(utilização de proteína muscular como fonte energética). Na base destas alterações metabólicas estão oTNF-, IL-1 produzidos pelos macrófagos (o TNF-p. ex.,suprime o apetite e inibe a acção da lipoproteína lipase, impedindo assim a libertação de ácidos gordos das lipoproteínas).

Efeitos hormonais
Resultam do efeito de hormonas produzidas no tecido de origem do tumor. Os tumores benignos ou malignos fracamente anaplásicos –induzem hipersecreção hormonal:
- Adenoma das células beta -induz hiperinsulinismoe hipocalémia (coma);
- Adenoma do cortex suprarenal –induz hipersecreção de aldoesterona(hipertensão, retenção de Na+ e H2O, hipocalémia).

Sindromas paraneoplásicos
Ocorrem em 10 a 15% dos doentes oncológicos e associam-se a muitos tipos de tumor, embora mais frequentes no cancro da mama, no cancro do pulmão e em neoplasias hematológicas. Os efeitos mais frequentes são a hipercalcémia, o sindroma de Cushing e a endocardite trombótica não bacteriana
- Secreção ectópica (carcinoma do pulmão): produção de insulina, PH like (hipercalcémia), ADH e ACTH like (sindroma de Cushing);
- Endocardite trombótica não bacteriana e trombose venosa dos membros inferiores (tumores pancreáticos ou pulmonares): resulta de um estado dehipercoagulabilidade que favorece a formação de trombos venosos.




Causas dos tumores

Há fortes evidências de que os tumores são causados por dano genético:
- Os neoplasmas apresentam alterações características nos seus genes que não são encontradas nas células vizinhas normais e quando estes genes alterados são isolados e introduzidos em células normais detectam-se nestas propriedades neoplásicas;
Vários (provavelmente cinco ou mais), genes tem que ser alterados para tornar uma célula normal em neoplásica. As mutações ocorrem em genes que normalmente regulam a divisão celular e a arquitectura dos tecidos. Por exemplo, um receptor para um sinal de estimulação do crescimento celular pode sofrer uma mutação de que resulte estimulação permanente da divisão celular ou então uma proteína que habitualmente bloqueia a divisão celular pode deixar de o fazer porque o seu gene foi suprimido.
A maioria dos genes implicados nos cancros humanos controla o ciclo celular, directa ou indirectamente, podendo classificar-se , genericamente, em quatro grupos de genes reguladores que são os principais alvos das lesões genéticas responsáveis pelos cancros:

- Proto-oncogenes, promotores do crescimento, cujos produtos apresentam uma activação excessiva nas células tumorais. Estes genes operam, em geral, de forma dominante. A activação de um dos alelos é suficiente para que tenham efeito;

- Genes supressores tumorais, inibidores do crescimento, cuja inactivação funcional se associa ao desenvovimanto dos tumores. Dado que existem dois alelos, são necessários, em geral, altrações em ambos para perda completa de função;

- Genes implicados na reparação do material genético e no controlo da integridade do genoma. Do ponto de vista genético comportam-se como os genes supressores, sendo necessária a inactivação de ambos os alelos;

- Genes reguladores da apoptose. Neste grupo de genes incluem-se os genes pró-apoptóticos que actum como oncogenes (ex. Bcl-2) e os genes anti-apoptóticos que actuam como genes supressores tumorais (ex Bax);

De uma forma geral, os produtos dos proto-oncogenes induzem as células a dividirem-se. As mutações ocorridas num proto-oncogene alteram a sua estrutura e activam-no, produzindo um oncogene. O produto proteico de um oncogene está alterado de forma a não ser desactivado pelos sinais celulares normais e a sua expressão induz a célula a dividir-se continuamente;

Alguns indivíduos são predispostos ao desenvolvimento do câncer porque herdaram uma mutação genética num proto-oncogene ou num gene supressor, ou ainda um defeito na reparação do ADN.

Produtos proteicos de oncogenes:
- Factores de crescimento: c-cis e ras
- Receptores transmenbranares dos factores de crescimento: ret, c-erb B-1 e B-2
- Proteínas citoplasmáticas transdutoras de sinal: c-ras e c-abl
- Proteínas nucleares de transcrição: myc, myb, jun, fos e rel
- Ciclinas e CDK (cinases dependentes das ciclinas)

Produtos proteicos de genes supressores tumorais:
-Factores inibidores do crescimento: BRCA-1
-Moléculas que regulan a adesividade celular: DDC, E-caderina e APC
-Moléculas que regulam a transmissão do sinal: NF-1
-Moléculas reguladoras da transcrição nuclear e do ciclo celular: Rb, WT-1 e p53

Genes reguladores da apoptose: bcl-2(aumentado nos linfomas), bcl-x, bax, bag, bad e p53 (aumenta a transcrição do bax). O bax opõe-se ao bcl-2, acelerando a apoptose. O nível relativo destes dois genes regula a sobrevivência celular.

Agentes Causais

A incidência do câncer varia entre as populações humanas e muita desta variação parece ser de origem ambiental. Os agentes que reconhecidamente causam o câncer incluem mutagénios químicos, radiação ultravioleta ou radiação ionizante, mas também uma grande variedade de agentes químicos não mutagénicos, certos víruse outros agentes ou circunstâncias que causam aumento da renovação celular, tal como, por exemplo,inflamação crónica;
Os agentes carcinogénicos são na maior parte dos casos substâncias químicas inertes até serem activadas pelo metabolismo (nitrosaminas cancerígenas no estômago por reacção de nitritos com aminas secundárias). Tipicamente, são moléculas lipofílicas que são metabolizadas nas células parase tornarem derivados mais hidrossolúveis e quimicamente mais reactivas. Alguns carcinogénios apresentam especificidade de tecido ou de espécie, devido principalmente a variações metabólicas;
A radiação ionizante origina na célula radicais livres que reagem com o ADN, o qual pode igualmente ser danificado por mutagénios químicos. Tais danos podem, muitas vezes, mas nem sempre, ser reparados; 

As circunstâncias ou agentes químicos não mutagénicos que ajudam no desenvolvimento do câncer, sem provocarem directamente mutações, são designados por promotores(hormonas da pílulacontraceptiva/câncer da mama, asbestos/câncer da pleura, fumo do cigarro/câncer do pulmão), os quais podem, por exemplo, aumentar a divisão celular ou permitir que as células mutantes escapem da influência restritiva das células vizinhas.

Principais factores de potencial carcinogénico (promotores carcinogénicos)

Químicos
•Hidrocarbonetos policíclicos (alcatrão do cigarro-pulmão)
•Aminas aromáticas (indústria dos corantes e da borracha –urotélio)
•Nitrosaminas (sistema GI –reacção de nitritos com aminas secundárias)
•Agentes alquilantes (acção directa sobre o ADN)

Virais
Epstein barr(Lintoma de Burkitt; carcinoma nasofaríngeo)
•Hepatite B (Carcinoma hepato-celular)
Vírus do papiloma humano (Carcinoma cervical, alguns carcinomas da pele, etc.)
•HTLV-I vírus da leucemia humana de linfócitos T tipo I (Linfoma das células T)

Irradiação ou substâncias radioactivas, radiação UVB/UVA
•Carcinoma basocelular, carcinoma spinocelular, melanoma maligno

Hormonas
•Estrogéneos, Testosterona (carcinoma da mama; adenoma e carcinoma da próstata)
•Citoquinas (vários tumores)

Fibras de Amianto (Asbestos) (cancer da pleura)
Factores Dietéticos: muita gordura e pouca fibra (carcinoma do colon ?)

Epidemiologia das neoplasias: agentes identificados com o desenvolvimento das neoplasias na espécie humana

•Tabagismo: carcinoma do pulmão, etc.
•Múltiplos parceiros sexuais: carcinoma da cervix
•Indústria da borracha: carcinoma da bexiga
•Micotoxinas (Asperg. flavus): carcinoma do fígado
•Exposição a radiação ionizante: arcinoma da tiróide

Factores ou condições pré-neoplásicas: condições ou doenças não neoplásicas as quais, no entanto, encerram um risco acrescido de desenvolvimento de neoplasia.

•Hiperplasia endometrial ou da mama: carcinoma do endométrio oucarcinoma da mama
•Gastrite crónica: carcinoma do estômago
•Colite crónica: carcinoma do colon
•Cirrose hepática: carcinoma hepato-celular
•Tiroidite auto-imune: linfoma da tiróide.

Terapêutica Anti-tumoral

Remoção cirúrgica: é directa, rápida, eficaz e constitui a terapêutica mais utilizada. É o único método que permite o estudo anátomo-patológico. Não garante a eliminação de micrometásteses e obriga à remoção de muito tecido são vizinho do tumor. Não está indicada quando o tumor já invadiu as estruturas adjacentes ou já se dessiminou.

Radioterapia: Em alguns casos pode ser preferível à cirurgia. O tumor é irradiado com raios X ou raios emitidos por fonte externa ou por implantes intraorgânicos definitivos ou temporários (braquiterapia). Provoca a morte das células neoplásicas por acção directa ou por indução de apoptose. Utilizada por ex. no cancro da próstata, da mama, da laringe, e do colo do útero, particularmente quando a cirurgia não está indicada, por se tratar de um tumor não localizado no órgão ou por o doente não ter condições operatórias. Não está indicada no caso de tumores disseminados.

Quimioterapia: administração sistémica de drogas citotóxicas que impedem a replicação do ADN e portanto a divisão celular por mecanismos diversos, ou por activação de apoptose. Fazem habitualmente parte de tratamento combinado que também envolve a cirurgia e/ou a radioterapia. Embora eficaz no tratamento de alguns tumores primários como a leucemia, é principalmente indicada na doença metástica. As drogas conhecidas induzem quimiorresistência que por vezes é múltipla.

Hormonoterapia: tratamento baseado no bloqueio hormonal por down regulation (análogosdaLHRH /triptorelina –cancro da próstata), ou utilização de antiandrogénios (cancro da próstata -bicalutamida) e antiestrogénios(cancro da mama).

Imunoterapia: o objectivo é estimular o sistema imunitário. Já foram usados estimuladores gerais como o BCG no cancro da bexiga. Mais recentemente, têm sido usados a IL-2 e o INFpara estimular células citotóxicas específicas.

Terapêutica genética: ainda em fase inicial; actuam directamente a nível dos genes envolvidos ou das proteínas codificadas por esses genes, tendo por objectivo tornar as células malignas em normais ou matar as malignas sem lesar as normais.
Inibição da angiogénese: tem sido alvo de grande interesse nos últimos 10 anos, tendo já sido desenvolvidos alguns inibidores que se encontram em ensaios clínicos. Ex. do bevacizumabaprovado há 4 anos, anticorpo monoclonal que bloqueia a acção do VEGF(Factor de crescimento endotelial vascular), impedindo a formação de neovasos.

Modificação da adesividade celular: as alterações da adesividade celular são vitais para a progressão do tumor, daí que com a sua modificação seja possível evitar o crescimento e a disseminação.
Inibidores das proteiases: a inibição das proteiases, particularmente das metaloproteinases da matriz (MMP), associadas ao crescimento neoplásico, pode ser um importante mecanismo de controlo.

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